segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

A tecnologia está afetando sua relação com seu filho?


Um dia você dirá ao seu filho que na era primitiva em que você nasceu não havia internet e ele provavelmente irá perguntar a qual espécie de dinossauro você pertence. Natural. Para alguém que já nasceu conectado à rede, deve ser muito difícil conceber um mundo sem ela.

Rede. Acho engraçado esse termo. Dá uma ideia de armadilha. É como se estivéssemos todos presos em uma grande teia. Entramos meio que deslumbrados com aquela sensação de euforia e encantamento e de repente nos demos conta de que já não podemos mais sair. E agora?

Não sou contra a internet. Isso seria inclusive contraditório para mim, que me encontro nesse exato momento escrevendo um texto para postar em um blog, e sou extremamente grata por isso. Sou grata pela oportunidade de compartilhar experiências e trocar ideias com pessoas que provavelmente nunca fosse conhecer. Grata pela possibilidade de cursar uma graduação a distância que no meu contexto atual seria impossível realizar de forma presencial. Grata por todas as facilidades que ela me proporciona. O meu desespero surge quando percebo que o preço que ela cobra pelos serviços que oferece talvez seja alto demais: a nossa própria vida. O homem parece ter se tornado escravo da própria criação, pois não consegue mais nem por um minuto sequer viver sem ela. É angustiante, se você observar. Está em todo canto. Nos restaurantes, nos bares, nas praias e até mesmo no trânsito. Em qualquer lugar que você vá, lá estará aquela legião de zumbis com os olhos vidrados naquela telinha diabólica. Pessoas tão próximas e ao mesmo tempo tão distantes, mergulhadas cada uma no seu próprio universo virtual. Como mãe, não posso deixar de me perguntar: de que forma isso estará afetando as nossas crianças?

Quando eu era pequena, uma das coisas que mais gostava de fazer era brincar de sereia na piscina com as minhas amigas. Para isso a gente não usava nada, nadinha mesmo, além da nossa imaginação. E era tudo tão real para mim. Eu via claramente o barco naufragado, os príncipes que a gente tinha que salvar, o caranguejo que falava com a gente, os palácios. Uma cidade inteira construída embaixo do mar. Era tão real que até hoje me lembro dos menores detalhes. Outra das minhas brincadeiras favoritas era “viajar” com meu irmão. Para isso agente usava sim algo mais que a imaginação: duas cadeiras velhas de praia. Elas eram os bancos do carro que nos levava à nossa volta ao mundo. Hoje o mundo já vem pronto. As cidades já vem todas construídas. Não há o que criar. Os brinquedos são em sua maioria auto-brincantes. Eles “se brincam” sozinhos, dando à criança o papel de mero espectador da brincadeira. A variedade é grande, devo admitir. Ela pode matar insetos, partir frutas ao meio ou arremessar passarinhos com um estilingue, mas o movimento é sempre o mesmo. Não consigo achar que essa “praticidade” esteja fazendo bem aos nossos filhos. Só consigo pensar que estamos atrofiando os cerebrozinhos deles.

pais-terceirizadosOutra conseqüência ainda mais grave da conexão à rede, é a desconexão com o próximo que ela estabelece. Pais e mães conectados com o mundo inteiro e em silêncio com os filhos. Na era das mensagens instantâneas não há espaço para diálogo com início, meio e fim. E assim vamos nos tornando indivíduos também sem início, meio e fim. Como disse certa vez um amigo, “estamos nos tornando fluidos.” Não há tempo para frases completas, nem para abraços demorados. Mas por quê? Por que, se com a tecnologia fazemos tudo mais rápido que antes? Eis aí outro segredinho: é que ela não foi criada para dar mais tempo a você, mas para permitir que você produza mais e consuma numa velocidade ainda maior. Cada minuto que você ganha com o uso de engenhocas eletrônicas, será cobrado em dobro na avaliação do seu desempenho.

E esse universo paralelo que existe dentro da teia está substituindo cada vez mais rápido o nosso mundo real. Momentos reais não mais existem ou não tem a mesma graça se não puderem ser compartilhados “em tempo real” com todos os “amigos” através das redes sociais. Cada passo, cada suspiro, cada pum precisa ser transmitido ao vivo. A gente come, mas não alimenta o paladar nem o olfato porque estamos mais preocupados em registrar o prato numa fotografia sem cheiro e sem gosto. A gente vai à praia, mas não escuta o barulho do mar. A gente se olha, mas não se vê. E o nosso tato só sente mesmo o touch screen. Estamos perdendo os sentidos.

E como é ser mãe diante desse cenário? Como fica a nossa árdua missão de criar menino em meio a todo esse caos? A maternidade hoje é exercida de forma muito diferente de como era pra as nossas mães. Temos fraldas descartáveis a preço acessível e babás eletrônicas com transmissão de vídeo, mas temos também uma série de problemas e preocupações que elas não tinham. Para a maioria de nós talvez não seja viável pegar o caminho de volta e remar contra a maré tecnológica, mas creio também não ser o melhor caminho entregar-se indiscriminadamente a ela. Por melhor que seja, a tecnologia nunca irá substituir você na vida do seu filho. Berços vibratórios que balançam em três velocidades e tocam música clássica nunca serão tão aconchegantes quanto o seu colo quentinho e a sua voz desafinada. E desenhos animados em 3D, por mais educativos que sejam, não suprirão a sua participação efetiva na formação dele.

A tecnologia é boa, mas não pode ser usada para preencher lacunas deixadas por nós. Devemos estabelecer limites saudáveis na relação com os aparelhos eletrônicos, e essa regulagem deve ser exercida não apenas sobre a cria, mas também sobre nós mesmas. É importante nos policiarmos também, porque afinal de contas a educação acontece pelo exemplo. Não finja dar atenção ao seu filho enquanto conversa com pessoas que estão dentro de um computador ou celular. Não se limite a responder com monossílabos as perguntinhas sem sentido que ele faz. Mostre para ele as belezas do mundo real. E caso ele prefira um mundo diferente, estimule-o a criá-lo, em vez de procurar um universo virtual já pronto e livre de imperfeições. A imperfeição faz parte da vida. Quanto antes ele aprender a lidar com ela melhor.